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segunda-feira, 2 de julho de 2012

Epifania de Domingo à noite, parte I

As luzes da cidade iluminam minha passarela de conquistas recentemente inaugurada. São restaurantes, cinemas, baladas, lojas e parques sendo invadidos pela minha fome devoradora de todos os segundos possíveis. É a noite servindo de cenário para os meus passos recém aprendidos. Tenho aprendido a viver, enquanto caminho desvairada por cima do asfalto sujo, quase como um rato do banhado que procura algum tipo de reconhecimento. E então eu me jogo no primeiro bueiro, tentando procurar um objetivo fixo pra continuar nessa eterna busca. Busca pelo quê mesmo? Por brilho? Por vida? Por amor? Acho que por tudo. Acho que por respostas. Mas, fala sério, eu estou procurando por respostas nos lugares mais absurdos. É encantador e triste ao mesmo tempo. É sedutor e repugnante na medida certa, então por que não tentar? Me jogo de cabeça nesses bueiros, nesse racionamento de diversão barata. Barata uma ova, eles bem que cobram preços razoáveis, cujo teor não me satisfaz nem um pouco. Chega a ser irônico: Eu pago para ficar entediada.

Lá estou eu, de novo. São minhas expectativas sendo, uma a uma, quebradas. A música que embala o funeral dos meus princípios, a vodka que desce enquanto o torpor continua a subir. Eu vou ficando tonta e, de repente, tudo isso faz sentido. Enquanto o chão se move por baixo da minha falta de equilíbrio, aquelas milhões de constatações e teorias vão ficando de lado. É noite, eu devo me divertir. Não está divertido, mas posso ver diversão no torpor. É isso que manda aquele velho manual de instruções para solteiros felizes e independentes: Tu tem que sair, encher a cara e se divertir, só pra esfregar na cara dos casais o quão livre e autossuficiente a solidão pode te tornar. Opa, eu disse solidão? Quis dizer liberdade. Isso aí, é a liberdade na forma mais pura da palavra! E ai de mim que duvide disso. É quase como uma religião, cheia de dogmas e conceitos e rituais. A religião dos solteiros, onde veneramos nosso próprio ego e nos alimentamos de afirmações alheias sobre nossa própria personalidade falsa. É tudo um joguinho pré-meditado, com o intuito genial de nos engrandecer a alma. É triste, por que não funciona. É triste, por que eu não quero que funcione. Não precisa ser assim. Ou... Ou talvez eu não me encaixe nessa religião. Alimentar meu ego se torna cansativo e entediante: perde a graça depois dos primeiros quinze minutos de bajulação.

Funciona mais ou menos assim: Eu não conheço o cara, o cara não me conhece. Mas ainda assim, brilhantemente, ele diz que eu sou a mulher mais linda e especial do planeta Terra. Sabe, isso funciona que é uma maravilha quando tu pretende fechar os olhos e não se importar com o bom senso que fica gritando por baixo daqueles goles de bebida. Mas me permitir tal coisa é uma afronta à minha inteligência. Então desisto. Desisto, mas não só por ser incrivelmente inteligente e totalmente contraditória. Desisto por que te vejo. E é nessa parte que vem a minha loucura. Tente entender, não faço de propósito. Mas te vejo. Encostado nas paredes vermelhas com aquela expressão de tristeza forçada, beijando a menina da primeira fila da pista enquanto se pergunta se ela aceitaria algo a mais de um jeito bem safado que tu não sabe ter, jantando uma lagosta com a boca a boca aberta e os dedos sujos de molho, assistindo o filme do Johnny Depp com aquelas calças jeans surradas que eu odeio, caminhando pelas ruas com a cabeça baixa e o peito estufado por que tu não sabe se da mais ouvidos à tua insegurança ou ao teu ego naturalmente machista. Te ver destrói meus planos de felicidade suprema. Te ver dói, de uma maneira que eu gosto, de uma maneira que me assusta. São milhões de cópias do teu rosto em hologramas que meu cérebro projeta como uma forma de me fazer sentir uma solidão absurda, mesmo nos lugares mais alternativos e descolados possíveis.

Daí são horas de diversão desperdiçadas em hologramas. Conversamos, quase sempre, antes que eu saia de casa. Tu me diz que não faz sentido e que eu não sou assim. Eu te digo que vou, por que preciso esfregar minha independência na tua cara. E então vamos. Eu e tu. Teu fantasma me seguindo em cada centímetro dessa cidade. E isso me dá certa segurança. É sempre olhando pra ti que eu digo não aos caras, às enganações ou às ofertas de prazer fugaz. É sempre na tua presença que eu sorrio de uma forma libertadora e meio maluca, por que preciso me convencer de que estou fazendo muito bem o meu papel de garota descolada. É por ti que eu digo sim ao cinema, ao e-mail, ao encontro na próxima festa e ao sorriso falso de reconhecimento. É por ti que eu distribuo olhares sedutores e aquela voz aveludada. Te vejo decepcionado e isso me alimenta. É a minha psique provando, mais uma vez, que eu preciso de tratamento. É o meu ego ferido, mais uma vez, tentando me dar algum motivo plausível pra continuar nessa busca sem sentido por algo que não compreendo.

Quer saber? Acho que sei pelo que procuro. Mas admitir para mim mesma que saio procurando por ti só iria engrandecer o meu comportamento doentio. E, sejamos honestos, é sempre difícil admitir pra si mesmo esse tipo de coisa. É a verdade. Eu sei, é doentio. Entenda, mesmo doentio, ainda é verdadeiro. Entenda, sou meio maluca mas ainda consigo ser meio sincera também. É só que... Olho para as pessoas e não vejo esperança ou expectativas. Vejo sorrisos com prazo de validade e confianças emolduradas por punhais. Raramente encontro algum ser iluminado que esteja perdido no meio do caminho e, se tiver sorte, ele talvez tope por mim. Então te busco. Por que sinto certo amor, sinto certo ódio. Mas tu vale por todos esses virgens que me atrapalham. Oh, não entenda mal novamente. Virgens no sentido sexual, certamente, muitos deles não são. Mas quando digo virgens, refiro-me aos olhos. Ou ao cérebro. Ou ao coração. Há casos sem solução em que o individuo simplesmente é triplamente virgem, dá pra acreditar? E tu não. Tu é perito nessas coisas de olhos e cérebro e coração. Tu me da as respostas da vida e instiga a minha curiosidade infantil, enquanto distribui amor para todos os meus poros quase mortos. E é por isso que não posso admitir pra mim mesma que te busco: seria uma afronta à minha independência.

É só que sempre me decepciono. Por que não tem ninguém real nesses lugares que substitua o teu holograma. Não tem ninguém nesses e-mails e facebooks aleatórios que substitua as ilusões que eu tenho contigo. Não tem ninguém presente que substitua a simples ideia da tua presença. E essas conversas vazias não significam nada perto dos silêncios preenchidos por aquela intimidade que eu só tenho contigo. Tu não sabe, mas me irrita inconscientemente. Por que são nessas horas, nas horas em que eu mais quero amar a minha capacidade de não amar, que percebo que te amo. Te amo sempre em todo o momento, mesmo sem querer, mesmo querendo, mesmo quando te odeio. Fato que atrapalha muito a minha tentativa do não-amar. Que atrapalha o meu sonho americano da adolescente universitária livre para a vida ao estilo american pie. Não quero american pie, não quero sexo no banheiro, não quero correr nua pelo campus, não quero ficar de porre nas festas e nem colecionar caras que não conheço. Essas possibilidades só me lembram de tédio e mais tédio. Sono multiplicado por mil. Só multiplicam meu cansaço e minha saudade, o que dificulta em muito a minha ascensão social.

Mas não quero admitir isso, lembra? Quero continuar no meu teatrinho de menina descolada e aproveitar a minha juventude em certas futilidades necessárias. Antes de me tornar chata e romântica de novo, quero experimentar ser chata e jovial pela primeira vez. A verdade é que todo o estilo de vida é chato, por que tenta me limitar de alguma maneira e limites acabam com a minha independência e diminuem a minha inteligência de uma forma grotesca. No fim, sei que acabo sempre atirada na minha cama, olhando nos teus olhos projetados e pensando que te amo mesmo e que a vida é cheia desses dilemas sem importância que vivem me tirando o sono. E que, se tudo é uma questão de tempo, então em breve as coisas vão se ajeitar. E que nada, nada seja em vão.

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