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sexta-feira, 20 de abril de 2012

Bilhete Póstumo

Querido F.

Desculpa.

Sério mesmo, desculpa. Tá? Desculpa por tudo. Eu... Eu sinto muito pelo que aconteceu. Sinto mesmo, do fundo do coração. Por que foi tudo muito bonito e tal e obrigada por isso, mas me desculpa. Desculpa se eu tô saindo à francesa pela porta dos fundos da tua casa, com os meus chinelos entre os dedos da mão pra não fazer barulho. Desculpa se eu desligo meu celular, se eu excluo meu msn. Desculpa, desculpa mesmo. Eu queria que isso não tivesse que ser assim, mas tem que ser. Tem que ser por que eu não sei receber carinhos pela metade, amor pela metade, vida pela metade. E já que você tá ocupado demais na farra pra ser meu por inteiro, eu vou embora. Nada pessoal, é que eu prefiro assim mesmo. Mas me desculpa, tá? Desculpa se eu não quero ficar aqui como a boa garotinha de estimação que eu sempre fui. É só que esperar me cansa. E você sabe disso. Todo mundo sabe disso. Eu sou aquela que nasceu de sete meses, lembra? Não esperei nem pra nascer, quem dirá pra viver! Então desculpa, desculpa se eu sou impaciente e incompreensível. Desculpa se eu te amei pra sempre ontem, é que hoje eu acordei muito afim de não te ver nunca mais. Não foi minha intenção te dar o doce e depois sair correndo enquanto você saliva pelo gostinho. Mas é que eu sempre acabo fazendo isso mesmo. E é um erro que eu pretendo não cometer mais. Sério, parei com isso. Agora vou manter o doce bem escondido na minha geladeira pra não deixar nenhum idiota salivando por ele. Vou me esconder em casa, vou me excluir do mundo, vou morrer pra vida de lamentações. E tudo isso sem você. Sem velório. Sem nostalgia.

Amanhã eu vou nascer de novo, e vou ser alguém que é precisada e não que precisa. Amanhã eu vou ser a criança que abre os olhos pro mundo e se arrepende logo depois, por que eu não vou saber lidar com a luz delirante desse planeta esquisito. E o barulho da sujeira vai corromper minha audição inocente. E eu vou virar míope de novo, como uma revolta interna, uma negação infinita em ver as coisas como elas realmente são. Me desculpa se eu vou te deixar ai sozinho com todas as duvidas e preocupações dessa vida, é só que hoje eu me acordei muito afim de nascer de novo, sabe? Muito afim de fugir da sua casa e pular diretamente nos confins da morte. Uma espécie de libertação dessa vida de erros repetitivos e amores impossíveis. E como eu sou muito, muito legal, vou deixar essa carta pra você ler e saber o que foi que diabos me aconteceu, logo quando tudo estava indo tão bem. E no fundo, você vai ouvir a minha voz dizendo: "A verdade é que eu não lido bem com a felicidade, sabe amor?".

E vai me odiar de novo, por ter escolhido morrer por ti de novo.

Como eu faço toda vez que me decepciono.


 

Alguma cidade do fim da vida, em algum dia, de 2012.

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